sexta-feira, 31 de julho de 2020

Pó de Diamante (Diamond Dust, 2018)

Mostra de Cinema Egípcio - Parece que muito do cinema egípcio contemporâneo gira em torno de problemas políticos e sociais. Embora não seja o tema que tome conta de Pó de Diamante, filme do diretor Marwan Hamed, podemos dizer que são o ponto de ignição que motiva os acontecimentos que se sucedem na narrativa. Sendo esse acontecimentos algo inimaginável até que a trama nos é entregue, levando a tona cenas e diálogos que até então não faziam sentido algum.


Taha trabalha em uma farmácia próximo a sua casa. Parte do seu tempo é dedicado ao trabalho, enquanto a outra parte é voltada a seu pai, que é cadeirante. Todo o processo traz um amargor a sua vida, o pai que perdeu o movimento das pernas devido a um erro médico, o abandono da mãe que não suportou a situação do pai e, como um ápice que desencadeia todos o momento que seguirão, um brutamontes local que vive o atormentando em seu trabalho. 


Até aí Hamed nos envolve em um filme policial à noir dos anos 1960, alheio a todo o mistério guardado para os minutos seguintes. Quando o pai de Taha é assassinado, a suspeitas recaem sobre brutamontes que ele já havia denunciado a polícia. Mas então surge o mistério e entendemos porque o filme se chama Pó de Diamante. Além da vingança pelo assassinato, Taha entra em um universo criado por seu pai, onde um homicídio é justificado de acordo com seu discernimento do certo e do errado.


Mas voltando ao início do texto, esse universo foi criado quando o pai era ainda uma criança. Tendo perdido seus pais decorrente aos conflitos armadas que o Egito vivia, ele foi criado por um tio e adquiriu um patriotismo interessante, já que sua origem era judia. Vendo seu tio sinalizando aos aviões inimigos onde eles deveriam atacar, ele foi motivado ao primeiro assassinato, utilizando o pó de diamante, como ensinado pelo próprio tio. Esse e outros homicídios, assim como toda sua vida, está descrito com detalhes em um diário encontrado por Taha após sua morte.


Pó de Diamante é mais uma surpresa do cinema egípcio contemporâneo, o que me deixa a dúvida dos motivos que os impedem de ganhar asas e voar mundo à fora. O trabalho de Marwan Hamed é primoroso, apoiado por uma excelente fotografia e um conjunto de elenco que faz a diferença. Espero continuar tendo novas e boas surpresas nessa mostra preparada pelo CCBB e já anseio pela próxima edição.

quinta-feira, 30 de julho de 2020

Fotocópia (Photocopy, 2017)


Mostra de Cinema Egípcio - Podemos dizer que Fotocópia é um filme de sutilezas. Escrito por Haitham Dabbour e dirigido por Tamer Ashry, o longa aborda um tema pouco explorado no cinema egípcio, e que também não se vê muito no cinema mundial de hoje. A simplicidade com que a história é trabalhada acaba por ser tornar um dos destaques do longa, usando algum toque de comédia em cima do drama de personagens singulares, mas que precisam dividir seus problemas entre si. 

Dono de uma loja de fotocópias, Mahmoud é um aposentado que outrora trabalhava em uma redação, redigindo os textos escritos a mão por jornalistas. Durante todas a história, Mahmoud vive a descoberta do novo, mesmo quando o novo já não é tão novo assim, como no caso da extinção dos dinossauros. Além disso, ele também empenha o papel de uma conquistador, ousado, que procura em um romance com uma das moradoras do prédio onde tem a loja reviver o lado bom da vida.

Em certos aspectos, Fotocópia lembra a época do neorrealismo italiano, explorando o existencialismo de maneira sutil. As doses de comédia que aparecem hora ou outra dá ainda mais personalidade a narrativa, mostrando a reinvenção que os personagens fazem deles mesmos.

A Mostra de Cinema Egípcio segue com surpresas boas. Superando qualquer sinopse encontrado sobre os filmes, as histórias mostram o que há de melhor no país, com simplicidade, mas muito carisma e sagacidade.

quarta-feira, 29 de julho de 2020

Para Onde Foi Ramsés? (Where Did Ramses Go?, 2019)


Mostra de Cinema Egípcio - Escrito e Dirigido pelo egípcio Amr Bayoumi, Para Onde Foi Ramsés é um documentário essencial sobre um dos maiores, tanto em tamanho, quanto em significado, da Cidade do Cairo. Porém, não se trata apenas de uma viagem histórica, mas sim um resgate intimista da importância e referência que a estátua de Ramsés II teve em sua vida até 2006, quando foi realocada para o museu da cidade.

Durante entrevista na abertura da Mostra de Cinema Egípcio Contemporâneo, promovido pelo CCBB, Bayoumi afirma que, ainda em 2006, durante a realocação da estátua foram filmadas mais de três horas de operação. Por que então o filme só seria lançado treze anos depois? O maior problema em sua produção seria como abordar o tema. Vendo a ideia inicial, onde o diretor contaria a história a partir do ponto de vista da estátua, podemos dizer que valeu a pena esperar todo esse tempo, já que o roteiro final nos traz a história e uma perspectiva pessoal que começa na década de 1950.

Mas o filme não procura responder literalmente o título, o paradeiro da estátua fica claro desde o começo. A pergunta a ser respondida vem das lembranças da época em que Ramsés II estava no centro de uma praça, onde as ruas distribuiam pessoas para outros cantos da cidade. Aproveitando manchetes de jornais, fotos e gravações antigas, vemos a sucessivas mudanças pela qual o Egito passou desde 1950, seu jogo político até a revolta de 2011, que muitas vezes toma o protagonismo do documentário.

Em seu país, Para Onde Foi Ramsés? recebeu grande atenção de crítica e público, participando de festivais notáveis. Já aqui no Brasil, pouco ouviu-se sobre o longa e pode ser que essa mostra promovida pelo CCBB uma das únicas oportunidades para assistí-lo. E garante que aqueles que o fizerem, não irão se arrepender. A história contada por Bayoumi vai além de qualquer coisa que possa ser pesquisada em livros e internet, é uma narrativa não apenas de Ramsés ou do Egito, mas também de toda sua vivência no Cairo.